“Eu amo-te!”, gritei.
“O que é que isso tem de extraordinário? Diz-me!”
“Eu amo-te como nunca ninguém amou ninguém!”
“Porque é que há-de ser assim?”, respondeste, beijando-me pela primeira vez. Eu estava tão tenso, não dei por nada, queria que se abrisse um buraco no chão e me engolisse. Mas tu estavas calma, como se estivesses habituada.
“Para ti pode ser não extraordinário, mas, para mim, é!”
“Cala-te”, disseste, “Sabes lá se eu gosto de ti também…”
Gosto! Foi o que disseste. Foi “gostar” o verbo que empregaste. E eu não tive coragem de fugir de ti naquele momento e explicar-te que como tu gostavas de mim, eu gostava de ananás, de sair à noite, de comprar azulejos nos antiquários.
É tão difícil dizer “eu amo”. Mas eu disse. Disse sem te conhecer de parte nenhuma. Sem contar com o deserto da minha alma, onde me pareceu encontrar-te nos maus momentos da minha vida, desde menino até agora, numa forma nunca muito diferente da tua.
Não te pedi nada. Não fui eu quem falou primeiro em ser feliz. No dia em que me falaste nisso estive até às cinco da manhã sem dormir.
A culpa foi tua. Fui levado a viver ao pé de ti, a preocupar-me com os teus dias, a pôr-me a nu, escondendo o pouco que restava da minha solidão dentro da tua. Da solidão que era minha. Da solidão que se apaixonou por ti. Que era, mais coisa, menos coisa – eu.
Mais de uma vez te perguntei se ias amar-me para sempre. Mais de mil vezes. Não podes dizer que não te avisei. E por muito que jurasse que sim, por muito que me fitasses no fundo dos olhos enquanto dizias que o teu amor era como o meu, que não tinha fim, eu nunca acreditei
A tua morte resolveu tudo. Nunca mais vou amar ninguém.
É assim como deve ser. Desde o princípio dos princípios. Como é que pudeste apaixonar-te por mim com tanta facilidade e tão pouco sofrimento? Por mim, que nada valho. Por mim, que nada te dei. Como é que eu podia acreditar num tal amor?
Tenho saudades de ti. Mas não me custa sofrê-las, comparado ao que eu sofria quando estavas aqui comigo, deitada no meu ombro, a sonhar os teus sonhos, agarrada a mim, o meu amor, o meu amor a arder-me no coração, deitando fogo ao meu sossego, tanto era o amor que te tinha, e o terror e a certeza de perder-te.
Cardoso, Miguel Esteves – O Amor é Fodido.
A minha grande inspiração. E este excerto é ouro.
6 comentários:
O "Tudo é pouco" é dos melhores que aqui tens, na minha opinião. Curto, com raciocínio e sentimento lado a lado. Está muito bom mesmo, só o li hoje.
Miguel Esteves Cardoso é, sem dúvida, uma bela fonte de inspiração. Já para nem falar desse livro claro.. *
Desde já os meus parabens pelo blog que aqui tens =)
o excerto é muito bom, mas o livro nao me encantou em nada. mas se te faz escrever como tens escrito, continua, devora-o de uma vez :)
Obrigado amiguinhos :) *
man... não li muito do blog para saber se esta pergunta já tem resposta:
e o teu livro?
sim, eu sei: um blogger editar um livro - porque escrevê-lo já o fez quando postava - é um lugar comum. talvez para benefícios monetários, talvez para ver reconhecido num meio socialmente aceite e reconhecido o seu valor como pensador/crítico/escritor/pessoa que sente.
talvez não precises disso, eu nem li o blog todo para saber o que te leva a escrever. e se não o dizes, não te questiones quanto a isso. é a melhor forma de continuar a fazer algo que fazes tão bem. :)
desculpa o incómodo ;)
olha o MEC...cá anda ele!!!!...LOL...
eu só o li agora, mas valeu a pena...:)grande maluco esse gajo:P
(ando por aqui a ler textos teus)
enerva-me ser da msm opinião que 90% das pessoas...mas:...tens textos teus brutais eheheheh
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