domingo, 11 de janeiro de 2009

Uma história de 20 segundos

E eu pergunto-te, como quem quer roubar um rebuçado mas não tem coragem de ser rebelde, queres ser minha namorada? Tapo a cara com as mãos mas faço batota com os dedos, deixando umas frinchas aproveitadas pelo olhar, que te mira na esperança de um sorriso. Cambaleio para os lados, qual criança moribunda, sem saber o que fazer, enquanto aquele silêncio se assemelha a horas numa sala de espera. À nossa volta, todo o mundo gira, alheios a nós. Eu nem os sinto, tenho o coração a mil e um calor crescente que não ameaça parar. E tu, serena, com um olhar indecifrável, como que a parar o tempo. Fala, peço-te eu com aquele tom de voz de quem pedincha um chocolate no Natal. E olho para os lados, só porque não aguento encarar-te mais de dois segundos, visto que a vergonha se apodera de todos os poros. Escondo o sorriso parvo por trás das palmas das mãos o melhor que consigo, mas ele tende a escapar-se, não tenho como evitá-lo, é demasiado grande. Quem visse confundir-me-ia com algum anúncio televisivo com bebés a olharem para montras de brinquedos gigantes. Rompe-se a imagem e todos os pensamentos em que estava perdido, quando um som se atravessa desenfreadamente: Sim. Um sim dado como se lhe tivesse sido perguntado se gostava da cor azul. É justamente isso que é suposto ouvir-se. Os batimentos cardíacos - já por si altos - evoluem para hiper acelarados, o calor transforma-se em gotículas de suor e experimento também uns certos tremeliques nas pernas e comichões na barriga. É agora que damos um beijinho? - Perguntas-me, enquanto te desenho uma auréola mental no cimo da cabeça. Dou por mim a tentar recompor o meu ar embevecido e agir normalmente, quando consigo raciocinar a frase que proferiste. Ai, aqui, com tanta gente a ver...? Vergonha. E medo de nem saber fazer tal coisa. Sim. O meu sim é como quem afirma algo sem fazer ideia do que está a falar, ou se deixa levar pelo ritmo da conversa, já que se disse sim uma vez, agora é sim até ao fim. E logo após se ouvir tal coisa, outro momento estático se abate. Quem se mexe primeiro? Quem dá beijinho a quem? Ai, não vou eu primeiro, não, não. Tenho de me mexer, senão vou parecer totó, anda! Arrasto-me um bocadito para o teu lado, de modo a que os nossos braços fiquem encostados... Olho para ti, que fitas o chão, a brincar com os remendos da manta onde nos sentamos. Indago-me sobre o porquê de não seres tu a dar o primeiro passo. Encho o peito de ar e preparo-me para a explosão. Espreito por baixo dos teus cabelos e *plim*, tão depressa damos um beijinho como desatas a correr sala fora, aos guinchinhos e saltinhos, para ires ter com as tuas amigas, que já cochichavam fazia tempo. Eu, no mesmo lugar, paralisado, assisto a tudo, novamente a vestir a pele de bebé abismado com presentes gigantes, e três centésimos de segundo depois o meu cérebro volta a processar novamente informações, que me fazem ter a mais acertada das decisões... fazer o mesmo, mas na direcção contrária, ou seja, onde estão os rapazes. E assim subimos um degrau, no que à afirmação pessoal diz respeito.

Naquela altura era assim, tínhamos quatro anos, numa sala cheia de miúdos como nós, e éramos mais doidos que espertos. Nunca sei se crescer é perder estes comportamentos ou se, pelo contrário, é mantê-los. A seu tempo... saberemos.

7 comentários:

J. disse...

Quero essa magia de volta. Quero esse nervoso miudinho, aquela comichao na barriga.
Quero ser aquela criança outra vez. Agora tudo é medido, até os minutos que passamos juntos.

Quero um sim, assim, so um sim.
Inspirador =)*

Unknown disse...

Bem verdade, é justamente essa a mensagem :) obrigado*

Jazz disse...

Lol este texto deixou-me com um sorriso nos lábios. Acho que toda a gente passou por isso, nessa altura..era tudo bem mais simples, sem grandes entrelinhas nas quais nos perdemos agora.
A diferença, é que com 4 anos provavelmente durava só mesmo os 20 segundos. Agora, é bem capaz de poder durar a vida inteira..um nadita mais complexo :p

Anónimo disse...

E estamos de volta com os (muito) bons textos, não é verdade?

Um bom ano :D

Unknown disse...

- Já não dá para fugir a correr. É pena, às vezes dava jeito :D

- Ora seja bem aparecida :) Oh, obrigado. Fases menos queridas, compreende-se *cof*.
Bom ano para ti também*

Clara Mafalda disse...

tenho saudades de de fazer batota. e de que os exames me corram bem, tb! lol
beijinho

Palavras disse...

Ainda guardo as cartas dos meus enamorados! "Queres namorar comigo? sim, nao, talvez!" cheias cromos repetidos do livro do rei leão, como quem diz "este era o meu preferido e eu dou-to porque gosto mesmo a sério de ti!". olhares trocados dentro e fora das aulas, mas nada de brincarmos, já que quase nem falávamos. 13 anos depois ainda ouço "Eu gostava de ti e tu nem um beijo me deste!e dissemos nós que namoramos durante 4 anos!!" Sempre fui fiel...a mim mesma!!