Tenho para mim que se há uma verdade universal, é a de que, na Natureza, tudo tende para o equilíbrio. E se por um lado fiquei triste quando, no ano passado, classifiquei a minha Queima como a menos agressiva de sempre - embora fortíssima -, por outro comecei desde logo a preparar-me psicologicamente para a deste ano. E em boa altura o fiz, senão desconfio que não teria passado do primeiro dia.
Por falar em primeiro dia, coisas a reter: A serenata com a maior afluência de sempre. E quando me refiro a serenata, não falo daquele choramingar de bebés na Sé Velha, nada disso. Isso é para meninos. Só lá fui uma vez desde que me mudei para Coimbra, e foi só mesmo para gozar quem estava a chorar (e para confirmar que mais valia ter ficado mais tempo no restaurante). O bom da serenata são os convívios do after-choro. Aí já ninguém distingue se os olhos vermelhos são de ter estado a chorar, a beber ou a fumar.
De qualquer forma, caminhar três passos seguidos era uma tarefa hercúlea. Chegar aos finos um objectivo apenas reservado aos mais fortes. Conseguir manter um grupo de - vá lá - 6 ou 7 pessoas juntas por mais de 5 minutos... impossível.
O cortejo foi a morte. Eu e os cortejos sempre tivemos uma relação amor/ódio, mas este ano foi algo de transcendente. Antes de mais tenho a dizer que o meu carro estava lindo. Depois de tanto trabalho, foi bom olhar e dizer, em uníssono com os restantes 17 futuros (*cof*) engenheiros civis,
que orgulho, está mesmo lindo! Se arranjar fotos entretanto posto aqui para verem a obra de arte, mas basicamente era uma verdadeira rectro escavadora, com a pá à frente e a rectro atrás (pleonasmo?), a preto, e o restante corpo da máquina a azul claro e branco. O interior era forrado a cerveja, malibu, whisky, beirão, e tudo o que se pudesse imaginar. Estão a imaginar a beleza? Estão? Os júris não, visto que o consideraram o pior (leram bem) do cortejo. O pior! Que orgulho!
Orgulho porque a nomeação não se cingia à beleza estética, mas também - em grande parte - ao comportamento. Ora, o único carro que atrasa o cortejo, com tácticas inovadoras e inteligentes, só merece uma distinção.
Eu defendo a nossa causa ao júri: meus gays, então somos o carro número três, e vocês metem o condutor a dar gás pela Sá da Bandeira abaixo? Inadmissível. Procedimentos: Sair do carro, ultrapassá-lo, sentarmo-nos à frente dele e não arredar pé. Ou rabo. Ou corpo. Já ia de cada um.
Entre cervejas cheias atiradas para onde calhava, chatices com o público, zonas púdicas a nú e outras coisas afins, aquele carro mais parecia um zoo. E eu, qual criança inocente, lá no meio. Ao menos lá para o fim - em pleno largo da portagem - ainda arranjei tempo para tirar uma bela soneca em cima do tejadilho, estava mesmo cansadinho, soube bem. Ah, acabei o dia a dormir nas escadas (e quando digo escadas não digo vãos, nem intervalos de escadas, foi mesmo nas escadas, a pisar costelas) do meu prédio. Coisas que acontecem.
Conheci a filha do professor com o nome mais fixe de Civil: Professor Picado. Era mais alta do que eu, mas até era bonitinha, o que me pareceu uma boa hipótese de me vingar dele.
Que idade tens? Quase 19. Ah bom, não tens 18, tens quase 19, isso já é outra coisa! Esta juventude está perdida.
Esqueci-me três vezes do bilhete geral no carro, mas só reparei nisso quando estava a entrar no recinto. Uma delas, aliás, entreguei o bilhete, ao que o segurança me diz:
Oh amigo, isto não é o geral.Olhe que é, olhe aqui: Bilhete Geral.Sim, realmente um geral é... so que é o da Latada.E ri-me, porque chorar não adiantava de nada. Lá foi o desgraçado sozinho para trás.
Recebi uma mensagem - num day-after - que, de tão simples, me fez rebolar:
Babe, tavas tão lindo de amarelo!Nunca subestimem o amarelo.
Tenho também a referir que o palco secundário foi muito
underrated mas lá mais para o fim se afirmou como uma zona histórica.
Por fim, foi mais uma Queima em que o meu blog entrou em várias conversas nocturnas, muita gente se apresentou como leitor assíduo e ainda houve tempo para passarem por mim a berrar "eu é que sou a fã do teu blog!", enquanto alguém a puxava pelo pescoço. Tenho pena de não me lembrar de grande parte das pessoas que me falam nestas alturas, mas fica a intenção. O que sei é que sempre que elogiavam aqui o cantinho me dava vontade de encarnar os rabetinhas trajados na serenata.
Awww, já acabou. Tenho pena, foi uma semana alucinante - e desgastante -, mas foi, provavelmente, a melhor Queima desde que estou em Coimbra. E já conto quatro. Obrigado a quem fez dela inesquecível.